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Despertencer

Encontrei-te ao acaso numa noite dessas de verão chuvosa. Por ser verão ou por ser chuvosa, encontrei você. Não acaso simples, acaso planejado desses com hora e endereço lembrados.
Manhã seguinte, céu de efeméridas; pulsar atento ao teu olhar de arco-íris. Me pertencias, era o que dizia o idílio amoroso de meu pensamento, te pertencia com a brevidade da estima que tinha por mim mesma.
Mas um dia sem mais nem menos saíste do banho direto pra rua. No céu já não havia efeméridas e o teu olhar um tanto incolor, encontrou no retorno um pulsar desatento. Por acaso ou por destino, desencontrei você.

Nara C.

Pequena estranheza

Dançando na chuva - google images

Ontem o mundo me pareceu pequeno,
As luzes se expandiram
e os meus olhos puderam ver com ternura,
uma jovem bela na chuva.
A jovem se chamava Amor
e a chuva era o meu desejo
Por onde ela ousava pisar.

Nara C.

fantasia de zeugma

Amor que nem sempre é abstrato
solidão imprópria
entre dois nadas
impregnados de tudo;
tudo sobre o amor
que fantasiado tende a filmar caravelas de luz,
lampejos que disseminam o sêmen
da saudade anoitecida.

Nara C.

Reencontro

A primavera dos anos bateu-me a porta pela vigésima quinta vez;
depois de uma espera breve,
abri a porta de leve
a ponto de fazê-la adentrar.
- Veio cedo, disse eu.
- Melhor que nunca, respondeu sádica.
Rimos juntas desvairadas,
ao seu modo cada qual se despediu
numa felicidade insuspeita
forjamos risos e espreitas
de um reencontro tardio.

Nara C.

Ínterim

Meu desejo verte sangue e suor quente
salta trapezista por bocas
e línguas alheias.

Verossímil ao cuidado com as línguas,
beijo bocas com cautela
e afago olhos com razão.
Sobretudo se as retinas ainda jovens,
se misturem com ar sereno,
senil,
moreno

Nessa hora meu encanto cede
e meu desejo que antes verte
deleita não mais trapezista
numa cena pequena
da mais pura emoção.

Nara C.

Alento

Quem me dera
Na primavera
Olhar o sol da janela
Beijar o vento
Que tento
Tento em vão uma carícia
Delícia!
Ter a vida em cor assim
Nada ruim,
Quem dera.

Nara C.
Indigência


Peço uma esmola
a um coração carente
que de amor necessita
para se regenerar
e se assim não puder
desta forma se arrumar
peço por caridade
que façam essa penitência
apreguem-o num quadro alto e escrevam:
“- morreu de amor, paciência!”

Nara C.

A...deuses

eu que em ti habita,
Transita contraditório na condição do você
Que inconseqüente me persegue.
Sacio minha sede de pele
No vão dos sonhos noturnos,
Que soturnos tendem a me assombrar.
Impetuoso destino
Que logo me escapará
Por entre os dedos, frases e janelas
E então... será tempo de te esquecer.
Vejo-te ainda numa distância que a mim não pertence;
Como outros que se apagaram
Viraram poeira e pó
Tu apenas se vai como os outros
Numa distância que a mim não pertence mais.


Nara C.

Motim

Um beijo
que desejo
a calma que o gozo em palavras
ressoa
e retumba n´alma insana
por quase nada profana
emerge em mim a loucura
que nem mesmo a
minha cura
é capaz de aplacar.

Nara C
27/9/10

Destemperança


Como o ipêzinho solitário,
que florido permanece em meio ao tempo insólito,
assim é o meu coração que sem grandes razões vive a esmo
entre a dor e a loucura.
Há em mim o desejo pérfido de um corpo,
me consome o fogo desse destempero.
Desejo que além de imundo galopa como um cavalo
pela raiz do meu consciente, me leva ao círculo vicioso
de onde não se pode escapar a menos que se açoite o cavalo abismo a dentro.
Há em mim a insanidade obscura a qual a razão não alcança
e entre as masmorras do inconsciente habita.
Há uma feliz saudade sentida, medida pela brevidade do abraço e dos beijos. Voracidade intermitente que até me deixa doente,
da dor que não cicatriza.
O ipêzinho vive em salutar primavera,
talvez dentro de si perdure a certeza de outras muitas estações.
Tal como ele sobrevivo solitária a estiagens e outras épocas adversas,
carregando o peso da permanência.
A primavera passa, e embora o sol resseque o meu caule
eu não posso deixar o vento levar minhas flores.

Foto: Ipê florido por Nara C.

Atemporal

A demora vocifera o desejo da chegada
causando um frenesi impróprio,
coisas de exatidão;
Sintonia permitida,
passagem liberada

O desejo agora galopa na vontade de te ver,
a passos largos a saudade
crava a espora no encantamento
Que idílio,
doce tormento.

Pecado consumindo à pancadas
a solidez do amor.


Nara C.

P.s.

À espera dela
acenando da janela
sinto que meu peito arde
e não sei se é saudade,
ou se é palpitação
eu só sei que me intimida
e é mais forte que a vida
essa coisa de paixão.

Nara C.
13/09/10

APRENDI... (Baseado no texto de Shakespeare)

APRENDI de uma forma bastante dolorosa que se pode superar a perda,
que ela vem independente de quantos artificios usamos para impedí-la.
APRENDI que dá pra se viver com a partida, que ela é substantivo impróprio quando se fala de emoção.
APRENDI de maneira insuportavelmente dolorida que uma noite é tempo demais para se passar sozinho, ainda mais se esse tempo for usado para chorar.
APRENDI que a dor, essa que se sente na solidão de dois mundos, nos modifica à medida que aprendemos à moldá-la à nossas ações; que é possível até encontrar respostas positivas nessa dor.
APRENDI que não adianta usar todas as forças e argumentos para que uma pessoa fique em nossa vida, ela não ficará a menos que queira.
APRENDI que essa mesma pessoa pode voltar com o tempo, mas esse tempo poderá repetir o passado, principalmente o que não se resolve.
APRENDI que se pode ser feliz com o que se tem. Pequenas alegrias compõe o que chamamos de felicidade, e são nas horinhas despercebidas que a encontramos.
APRENDI que ser enganado por um amor, não é tão pior que por um amigo, e que é muito fácil acreditar numa mentira dita por alguém que se importa.
APRENDI que viver dignamente, requer mais que ser alguém, é preciso ver além, ter fé e entusiasmo para levantar na queda e não perder jamais a coragem de continuar caminhando.
APRENDI que algumas pessoas continuam na nossa vida por algum motivo e normalmente levamos um tempo para reconhecê-lo.
APRENDI que é possível conviver com o descaso, desde que não se dê tanta importância a ele.
APRENDI que a melhor maneira de ser feliz é aceitar com ternura o que não se pode mudar, pois viver é encontrar na mudança o trampolim para a melhora, mas se ela não vem, não é motivo para o desespero.
APRENDI que ainda que percamos a esperança, há sempre algo novo à nossa espera, para substituir ou acrescentar o que nos falta.
APRENDI com a demora que não faz mal uma dose de pressa e aprendi com essa que nem sempre ela pode ser inimiga da perfeição.
APRENDI que o tempo de vida que me resta é ainda grande o suficiente para reaprender quantas vezes forem necessárias e até lá terei finalizado a missão de aprender, visto que enquanto viva jamais perderei essa capacidade.


Nara C.
Paraíso dos Ipês/ Setembro de 2010

Quem disse que no fim do poço só existe lama?

A vida como experiência diária nos apresenta de maneira simples seu verdadeiro significado, o que nem sempre é interpretado por justamente ser de igualdade simplória. Um arco-íris impregnado de cor nos trás a realidade uma pitada de mistério, há quem não aprecie? Um dia de chuva, um encontro marcado, acaso feito de páginas, retratos e memórias. Mesmo a vida apressada dos compromissos inadiáveis e nem sempre agradáveis, nos faz melhores, mais humanos, amadurece a folhagem dos dias, que imperceptíveis tendem a nos roubar bons momentos.
Houve quem já dissesse que no fim de um túnel frio e horripilante brilha uma luz, mas de onde esse cara tirou que ela só brilha no fim? Existe luz por toda parte especialmente no começo da nossa jornada que ainda imaturos relevamos os detalhes tão precisos do tempo.
A vida se esgueira por esses detalhes e cegos somos descrentes quanto ao seu sentido, cair, se sujar, se erguer e recomeçar é parte de um longo processo ao qual chamamos: AMADURECER.


Nara C.

Morrer de amor e continuar vivendo

Discutir sobre relações é por vezes complexo, difícil e incoerente. Por que nem sempre aquilo que pensamos na teoria, se torna a prática nossa de cada dia.
Somos amados à medida que achamos que somos, talvez isso explique por que tantas pessoas se encontram infeliz no amor, achando que não é correspondido, que não é amado... esses tipos de dúvidas comum a todo ser bípede portador de um coração carente de afeto, atenção e disposições físicas.
O fato é que ninguém entende o por que das escolhas feitas, o porquê das mudanças repentinas, do destempero, das discussões bobas e do ciúme ardil. Mais fácil explicar quantos motivos não havia, do que procurar um.
No fundo ninguém tem um manual de relação perfeita, e todos sofrem por um motivo que eles mesmo inventam, porque razão até há, mas ela nunca é unilateral e é aí que buscamos a válvula de escape para as eventuais decepções. O amor próprio é um dos segredos que pode recolocar nossa sã consciência de volta à órbita.
Por que morrer de amor, até pode... mas é bom continuar vivendo.

Nara C.

Felicidade o que é?

Felicidade é nome próprio? substantivo? conotação?
quando foi que inventaram a luz? quem sabe nao foi jesus?
sigo cá com minhas dúvidas nessa imensidão de céu
imenso porém são meus rastros
que passam fazendo traços
laçando qualquer compasso
sem se interessar no por quê

Imenso porém é o meu peito que tem por dentro um defeito:
de guardar quinquilharias
sorrisos desesperados, amores bem atrasados, paixões essas das grandes
(ainda que pequenas de nome)
e uma dúvida que se trumbica, assim que comunica:
se tenho amor e saudade
paixão que não é maldade
o que posso querer mais?

Se tenho lembrança antiga
amor que vale mais que a vida

Felicidade o que é?

Canto de longevidade


Em tuas manhãs dormidas
sossegas teu pensamento
no seio de vendavais;
mesmo espairecido
teu canto tão pouco ouvido
repousa em lençois floridos
teu cheiro de carnavais.


(Nara C.)

Ode ao imperfeito

Gosto do gosto amargo do café,
da televisão sem som,
do tapete gasto, desbotado e maltratado.

Gosto de gostar do incomum,
das peripécias que apronto com minha própria imagem,
rindo sóbria e desvairadamente
do que me distrai.

Sonho sempre com um jabuti morto à beira da estrada;
ele traja roupas de humano e carrega um saco de coisas velhas às costas.
O jabuti usa botas de borracha e sorri pra mim um riso amarelo, feio, murcho. Me aproximo, ele foge, volta a dormir o sono dos mortais; mesmo animal que não pensa, faz sua pausa para a morte e eu pauso do sonho para acordar no sono, livre do espanto, apenas rindo sóbria e desvairadamente do que me distrai.

**

S.O.S Haiti



Uns e outros estão pagando a conta pelos pecados do mundo. O Haiti vive hoje o que o resto do mundo NÃO gostaria de viver: catástrofe, dor e desgraça na sua forma bruta. Específica. Descomunal.
Seria a fúria de Deus? Ou o troco da natureza revoltada contra o homem?
Não há resposta suficiente para a quantidade de perguntas. O mundo despreparado assiste seu próprio enterro. E o homem que se diz superior, limita-se a sua insignificante sabedoria ante o universo.
Que fazer diante de tamanho caos?
Tem-se solução para praticamente tudo, inventaram a chamada revolução para indicar progresso, ou em outras palavras: PODER.
Decifraram segredos e mistérios da natureza e conquistaram com isso grandes avanços em prol (pasmem) da própria inexistência humana.
Revolucionam tudo, inclusive o conceito de Deus que hoje é culpado pela fome, miséria e tragédias como essa.
Em meio ao caos o homo sapiens se esquece de sua origem e impotente reconhece o seu tamanho debaixo do céu.


***

Cá com meus botões


De três coisas a solidão me serviu:
do egoísmo sensato em que volto a pensar em mim,
da avaliação sóbria que faço do mundo (e amadureço)
e da escrita que ponho a parir a torto e a direito (mais torto que a direito).

**

Janeiro

Já é Janeiro
mais um entre alguns
Janeiro que por ventura vim ao mundo
primeira parcela do tempo, do meu tempo...

Janeiro que eventualmente me orgulha,
que com alegria é esperado
e com graça admirado
pela pressa ou demora

Comemoro Janeiro com a felicidade de quem celebra
não só um novo tempo
mas a vida
as chegadas e partidas
e a graça oportunizada pelo novo ciclo

De glória coroo janeiro
pela dádiva de pertencer-lhe
e por assim ser, ter essa sede de principiar
pelo caminhos que me aguçam e apetecem
partindo sempre não com a pressa de quem jamais chega
mas com a demora de quem deseja ficar aqui e ali
desfrutando sempre do inicio
nunca do fim

E já que Janeiro representa começo
é bom lembrar que antigos amores
tiveram suas raízes aí neste Janeiro;
Antigos rostos e vozes que hoje me são gastos
pela memória do tempo
Marcaram cada Janeiro
que por ser um mês de entrada me presentou algumas vezes
com um novo amor ou paixão

Somam-se vinte e quatro os janeiros que conheci
Tive a sorte de contar de sobra os Janeiros
que de graça a vida me deu

Janeiros de cor de gaio,
Janeiros de minha vida.

**